Psicoterapia deve ter metas e não se estender por anos
Terapeuta dos EUA causa polêmica ao defender que a maioria dos pacientes precisa só de poucas semanas de tratamento e que terapia deve ter objetivos para não ser um “desabafo”
Há 15 dias, o psicoterapeuta americano Jonathan Alpert mexeu com os brios dos colegas ao publicar um artigo no “New York Times” em que questionava a eficácia de tratamentos de longo prazo.
Citava um estudo de 2010 no “American Journal of Psychiatric” para dizer que só 10% dos pacientes fazem mais de 20 sessões e um de 2006 no “Journal of Consulting and Clinical Psychology” para afirmar que o progresso cai de 88% para 62% após a 12ª sessão. Culpava os pares.
A resposta, diz, veio numa avalanche de e-mails tanto mandando-o para o inferno como elogiando por contestar algo pouco questionado.
Artigos contra e a favor se multiplicaram, cartas de psicanalistas chegaram ao “Times” pedindo cuidado com generalizações e a lista de clientes do psicólogo que atende em Nova York e acaba de lançar “Be Fearless – Change Your Life in 28 Days” (Seja destemido – mude sua vida em 28 dias, que sai no Brasil no fim do ano) cresceu.
Mas ele nega que ofereça solução mágica, como acusam os críticos que viram no artigo uma autopromoção.
Sua defesa, diz, é de uma terapia que mostre resultado, em que paciente e analista tracem metas e que não sirva apenas “para desabafar”.
“Pela minha experiência, a maioria busca ajuda para questões menores e tratáveis: insatisfação no trabalho ou no relacionamento. Não é preciso anos de terapia para isso.” Alpert conversou com a Folha por telefone.
Folha – Qual tem sido a reação ao seu artigo? Crítica?
Jonathan Alpert – Interessante. Recebi centenas de e-mails, muitos de ódio, inclusive de outros terapeutas, que me mandaram para o inferno. Mas para cada negativo vieram uns três positivos.
Na manhã após a publicação, a secretária eletrônica do consultório tinha umas 20 ligações de gente que queria se tratar comigo. No fim da semana, mais 60 [ele atende 25 pacientes por semana].
Qual era sua relação com os colegas antes do artigo?
Dividida. Há outros terapeutas aqui que têm essa orientação mais comportamental como eu. E eles me apoiaram -recebi vários e-mails elogiando a coragem.
Quando você diz que terapia de longa duração é pouco eficaz, você se refere aos casos de forma geral ou quer dizer que terapeutas ruins mantêm o paciente por muito tempo?
O segundo caso. E meu argumento é que se você está na terapia e não está melhorando, você tem de sair. Há muita diferença entre se sentir bem e de fato melhorar. Eu costumo usar a analogia do cabeleireiro -se você vai e odeia o corte, vai voltar para quê? Se você vai à terapia semanalmente há anos e não vê nenhuma melhora, saia fora.
Mas como medir se a psicoterapia é eficaz?
O que eu faço, e muitos fazem, é definir metas desde o começo e monitorar o progresso. Se alguém com ansiedade social vem me ver, a meta é a pessoa se sentir confortável em um bar ou um encontro. Vamos trabalhando e vendo como ela se sai.
Você já tratou alguém por mais do que 12 semanas?
Sim, claro, há gente que eu trato por meses, e depois faço sessões de manutenção uma ou duas vezes por mês.
Sempre com as metas?
As pessoas podem ficar patinando na terapia. Você vai, desabafa e se sente bem por falar. Aí espera aquilo toda semana, mas isso não necessariamente faz você avançar em direção a um objetivo.
E quando a terapia pode durar mais e ser boa?
Alguns transtornos precisam de mais tempo para serem tratados, como estresse pós-traumático. E condições psiquiátricas ou psicológicas mais graves precisam não só de mais tratamento, mas também de manutenção.
Não é o caso da ansiedade e da depressão leve, que levam a maioria ao consultório?
Eu cito essas duas no artigo. As razões que levam mais gente ao consultório -ao meu, ao menos- são ansiedade, problemas na carreira, problemas no relacionamento e estresse. Nada disso precisa de anos para ser tratado.
Mas qual deve ser o objetivo do terapeuta e do paciente? Um problema pontual pode ser resolvido em semanas, mas e a raiz? Se as circunstâncias mudarem na vida de um dos seus pacientes, os problemas não reaparecerão?
Você tenta ensinar a pessoa a resolver o problema, para que possa lidar com ele no futuro caso reapareça. Mas há quem não seja bom nisso.
Identificar o problema e dar ferramentas? Nada de discutir a infância…
Às vezes é relevante. Mas eu não passo sessões incontáveis falando sobre a infância. Os pacientes reagem melhor quando olham para a frente.
Como você percebeu que o tipo mais convencional de terapia não era o seu?
No começo da minha carreira, eu tinha pacientes que me diziam que seu terapeuta anterior só sabia perguntar “como você se sente com isso?”. Passavam anos assim, mesmo sem achar que funcionava. Eu escrevia uma coluna de jornal com pouco espaço e tinha de dar conselhos. Recebia cartas agradecendo pela ajuda e pensei que isso pudesse funcionar em terapia também. Identificar o problema e dar conselhos. A reação foi boa.
E por que muitos continuam indo à terapia, sem avanço?
Muita gente acha que psicoterapia é só para desabafar. Não sabe que dá trabalho, que muita coisa precisa ser feita fora do consultório.
Falta informação?
É. Tem uma ideia perpetuada por Hollywood. Se você perguntar para dez pessoas o que é psicoterapia, pode esperar que sete dirão que se trata de desabafar, se abrir.
Qual o maior erro ao procurar um psicoterapeuta?
Não sei, mas sei o que ajuda a achar um. Boca em boca é bom, se você se sentir confortável para perguntar a amigos ou conhecidos, porque há estigma ainda. Também dá certo perguntar ao seu médico.
É preciso pesquisar. Telefonar, ao menos, a alguns terapeutas, falar com eles por uns dez, 15 minutos, para ter ideia do estilo, perguntar como ele trataria seu problema.
Não há quem tenha medo de perguntar ou de cobrar soluções ao terapeuta? O mecanismo, afinal, tem duas partes…
Verdade. Eu sempre digo a meus pacientes que nós dois temos de trabalhar duro e que ele precisa implementar os novos comportamentos fora do consultório. Se ele está esperando uma solução mágica, não vai acontecer.
“O Segredo” fez sucesso.
Acho que há pessoas procurando mágica. São preguiçosas. Se você puder acreditar que vai virar um milionário, é mais fácil do que arregaçar as mangas e dar duro.
Terapia é para todos?
Não. Não acho. Acho que a pessoa realmente tem de querer olhar para si mesma e mudar. Se não é um desperdício de tempo e de dinheiro.
Mas muitas vezes é posta como solução universal.
Algumas pessoas são narcisistas, egocêntricas, falar por uma hora e ser o centro das atenções as satisfaz.
A crise econômica aumentou seu trabalho? Você participou de “Trabalho Interno” (documentário de 2010 premiado com o Oscar).
Em 2008, eu comecei a receber cada vez mais pacientes de Wall Street, com problemas de ansiedade ligada ao trabalho. No fim do ano, foi um surto. Eram sobretudo homens, executivos, perdendo o emprego… O problema é que a identidade deles estava tão fundida com sua carreira que, quando eles perdiam o emprego, a vida deles perdia o sentido. Nunca queira se definir por sua carreira.
Melhorou?
Acho que as pessoas se acostumaram.
Fonte: Folha