Entenda o que é o oxi e como a droga se espalhou pelo Brasil

O oxi já apareceu em diversos estados, como alternativa barata ao crack. Os primeiros relatos de consumo do oxi foram registrados no Norte do Brasil, mas, nos últimos dois meses, a droga já foi apreendida em pelo menos 13 Estados do país.
Apesar de ter sido apontada como uma nova droga pela mídia, o oxi é considerado por especialistas como uma variação mais barata e tóxica do crack, que combina a pasta base de cocaína com substâncias químicas de fácil acesso.
Entenda as principais características do oxi e saiba o que já foi descoberto sobre os efeitos e a proliferação da droga.
De que é feito o oxi?
O oxi é uma mistura da pasta base de cocaína, fabricada a partir das folhas de coca, com substâncias químicas de fácil acesso, como querosene, gasolina, cal virgem ou solvente usado em construções.
De acordo com o perito do Instituto de Criminalística de São Paulo, José Luiz da Costa, a fabricação da pasta base de cocaína – da qual também são feitos a cocaína em pó, o crack e a merla – também é feita utilizando uma substância alcalina e um solvente para extrair uma maior quantidade do princípio ativo da planta, responsável pelo efeito principal da droga no sistema nervoso.
“Para se transformar em oxi, a pasta recebe novamente uma quantidade de solvente e alcalino. Só que, desta vez, são produtos como o querosene e o cal, ainda mais tóxicos do que o bicarbonato de sódio, o amoníaco e a acetona, usados para fazer o crack e na cocaína em pó”, diz o perito.
A droga pode ser misturada ao cigarro comum e ao cigarro de maconha, mas, geralmente, é fumada em cachimbos de fabricação caseira, como o crack.
Segundo o psiquiatra Pablo Roig, diretor da clínica de reabilitação Greenwood, em São Paulo, o oxi libera uma fumaça escura ao ser consumido e costuma deixar um resíduo marrom, semelhante ao efeito da ferrugem em metais.
Por isso a droga recebeu o nome de oxi, uma abreviação de “oxidado”.
Qual a diferença entre oxi e crack?
A principal diferença entre o oxi e o crack no mercado das drogas é o preço.
De acordo com o diretor do Departamento de Investigações sobre Narcóticos de São Paulo (Denarc), Wagner Gíldice, o oxi é vendido por cerca de R$ 2 a R$ 5 nas ruas. Pedras de crack podem chegar a custar R$ 10.
O oxi é mais barato justamente porque é feito com produtos químicos que podem ser conseguidos sem fiscalização e a preços baixos. Também por causa da utilização destas substâncias químicas, ele é mais prejudicial ao organismo do que o crack.
No entanto, especialistas dizem que o efeito psicológico das duas drogas é muito semelhante, já que ambas tem o mesmo princípio ativo, que é a pasta de cocaína.
Segundo o psiquiatra Pablo Roig, tanto o crack como o oxi podem viciar os usuários mais rapidamente do que a cocaína em pó, porque chegam mais rapidamente ao cérebro.
“A cocaína absorvida em pó pelo nariz tem que passar pelo sangue até chegar ao cérebro. Por isso, ela demora mais para fazer efeitos do que crack e oxi, que são inalados e vão do pulmão diretamente para o cérebro em questão de segundos”, diz.
Mas Roig diz que, uma vez no organismo, o oxi é mais letal do que o crack, por causa do alto nível de toxicidade das substâncias de que é composto.
“A toxicidade do oxi encurta a vida do usuário em 20% em relação ao crack. Os usuários de crack vivem pelo menos 5 a 6 anos, mas 30% dos usuários de oxi poderão estar mortos depois de um ano”, afirmou.
Quais são os efeitos do oxi no organismo?
A psicóloga Helena Lima afirma que a droga age no sistema nervoso, proporcionando sensações variadas, que podem ir de prazer e alívio a angústia e paranoia a depender da pessoa.
“Pela descrição dos usuários, sabemos que o oxi faz efeito entre sete e nove segundos a partir do momento em que é inalado”, diz.
Uma vez no organismo, a combinação de substâncias do oxi pode causar lesões sérias da boca até os rins.
“Dizemos que o oxi é artesanal por causa da sua produção, mas, em termos bioquímicos, ele é bastante complexo e sofisticado e, por isso, muito prejudicial”, diz Lima.
Na boca, o querosene ou gasolina combinados com o calor provocam ferimentos nos lábios e na mucosa bucal, danificam as papilas gustativas da língua – células responsáveis pelo reconhecimento de sabores -, causam ferimentos no esôfago e corroem os dentes.
O cal virgem na droga pode provocar fibrose pulmonar, que prejudica a captação de ar pelo pulmão.
Os químicos adicionados à droga vão para o fígado, que é o órgão responsável por metabolizá-las. No entanto, a droga sobrecarrega o fígado e compromete suas funções, como a distribuição de açúcar no organismo.
Por causa disso, o uso prolongado do oxi aumenta as chances de doenças como cirrose hepática e o acúmulo de gordura no órgão.
“Muitas pessoas também misturam o oxi com o álcool, o que é ainda pior. A mistura forma uma substância chamada cocaetileno, que é altamente tóxica para o fígado. Por isso, vê-se usuários com lesões sérias no fígado em pouco tempo”, diz Pablo Roig.
Quem consome oxi também está sujeito a falhas nos rins, que também ficam sobrecarregados pela alta quantidade de toxinas resultantes da combinação química da droga.
A dificuldade dos rins em eliminar as toxinas faz com que elas permaneçam circulando no sangue, causando náuseas, diarreia e problemas gastrointestinais.
Além disso, o usuário também está vulnerável aos problemas causados pelo princípio ativo da cocaína, como o risco de ataques cardíacos e acidentes vasculares cerebrais (AVCs).
Como a droga chegou no Brasil?
Especialistas e investigadores afirmam que o oxi começou a entrar no país pela fronteira com a Bolívia, que é o terceiro produtor de cocaína do mundo, segundo dados da ONU.
Há relatos de que o uso do oxi começou em Estados como Acre e Pará há cerca de 20 anos, mas, ao que tudo indica, começou a se espalhar pelo país nos último sete anos.
Um dos primeiros estudos brasileiros a mencionar a droga foi conduzido pela psicóloga e especialista em saúde pública Helena Lima, no Acre, em 2003.
“A pesquisa foi publicada em 2005 e fui muito procurada para falar sobre o oxi. No entanto, era uma droga desconhecida em um Estado pequeno no Norte do país. Por isso, ela foi ficando em segundo e terceiro plano na medida em que o problema do crack cresceu”, diz a pesquisadora.
Nos últimos anos, o oxi passou a ser produzido no Brasil utilizando a pasta base de cocaína conseguida através do narcotráfico e os produtos químicos locais, como cal, querosene, gasolina e solvente.
“Acho que o fator estrutural do crescimento do oxi é a fragilidade do controle dos insumos químicos. A facilidade de acesso a essas substâncias acontece no país todo”, afirma Helena Lima.
A psicóloga diz ainda que, no Acre, a droga se espalhou através dos usuários. “O oxi passa de mão em mão, mas também podem haver criminosos e até policiais envolvidos na distribuição.”
O diretor do Denarc, Walter Gíldice, avalia que há uma grande possibilidade de que organizações de narcotráfico estejam diretamente envolvidas na proliferação do oxi.
“São os grandes traficantes que detém a pasta base, então eles podem estar por trás disso. Mas o que foi apreendido aqui já está sendo produzido aqui”, diz.
Mas Gíldice também alerta para o fato de que, por ser produzida artesanalmente, a droga tem características diferentes em cada Estado. “As pedras que estão sendo vendidas no Pará são diferentes das de São Paulo, por exemplo. Aqui, elas são mais parecidas com o crack do que lá.”
O que está sendo feito em relação à proliferação do oxi?
A Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) está realizando uma pesquisa de campo sobre o oxi no Brasil, a pedido da Secretaria Nacional Antidrogas (Senad), órgão vinculado ao Ministério da Justiça.
De acordo com Helena Lima, a pesquisa é essencial para entender como a droga está sendo produzida e a quem está atingindo em cada região do país.
“Apesar da idéia de que o oxi é uma droga mais comum entre as classes mais baixas e entre os usuários de crack, entrevistei desde analfabetos até pessoas com formação universitária usando oxi no Acre”, diz a pesquisadora.
“Só é possível combater o oxi sabendo como ele penetrou em cada Estado do Brasil, e isso depende das demandas do mercado de drogas em cada região.”
O jurista e ex-secretário nacional Antidrogas Walter Maierovich afirma que, além de campanhas que alertem sobre os perigos da droga, é preciso realizar um controle mais rígido da venda de produtos químicos de uso mais corrente, como o cal e os solventes.
As fronteiras do país, segundo Maierovich, também precisam de mais vigilância.
“Ninguém está indo nos municípios da fronteira e verificando o aumento da renda nestes municípios. Estes lugares geralmente são pequenos e têm uma movimentação de dinheiro limitada. Se, de repente, há mais dinheiro circulando do que a capacidade desse lugar, há algo errado”, disse.
O oxi já apareceu em diversos estados, como alternativa barata ao crack. Os primeiros relatos de consumo do oxi foram registrados no Norte do Brasil, mas, nos últimos dois meses, a droga já foi apreendida em pelo menos 13 Estados do país.
Fonte: BBC Brasil

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