MPF interpela CFM sobre vedação à prescrição da cannabis medicinal.
O Ministério Público Federal (MPF) instaurou procedimento preparatório (PP), nesta segunda-feira (17/10), para apurar a compatibilidade da Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) nº 2.324/2022, de 11 de outubro de 2022, o qual restringe a prescrição de cannabis medicinal apenas para alguns casos de convulsões. O MPF baseia-se no direito social fundamental à saúde, nos termos da Constituição Federal. O documento autoriza uso do canabidiol apenas para o tratamento de epilepsias da criança e do adolescente refratárias às terapias convencionais na Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa.
De acordo com o procurador da República Ailton Benedito de Souza, responsável pelo procedimento, a efetivação do direito fundamental à saúde é fator indutor da cidadania e da dignidade humana. Ele destaca que resoluções da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) também dispõem sobre o canabidiol (Resoluções RDC nº 327/2019 e RDC nº 335/2020), em especial sobre fabricação, importação, comercialização e prescrição de produtos de Cannabis para fins medicinais, autorizando os médicos a prescreverem a substância. Além disso, destaca que tais atos normativos podem ocasionar repercussões administrativas, financeiras e técnicas no Sistema Único de Saúde (SUS).
Providências
Como primeiras providências, o MPF requisitou à Anvisa documentos que consubstanciem as evidências científicas que sustentam a RDC nº 327, de 9 de dezembro de 2019, e a RDC nº 335, de 24 de janeiro de 2020. Igualmente, requisitou ao CFM documentos que traduzem as evidências científicas que sustentam a Resolução CFM nº 2.324/2022, de 14 de outubro de 2022. Por fim, requisitou ao Ministério da Saúde informações sobre as repercussões administrativas, financeiras e técnicas no SUS das resoluções da Anvisa e do CFM. O prazo para as respostas é de 15 dias.
Íntegra da Portaria nº 202/2022 que instaura o Procedimento Preparatório.
Protesto de médicos e pacientes no CREMERJ
Hoje aconteceu uma manifestação de médicos e pacientes contrários à Resolução nº 2.324 do CFM no Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro, CREMERJ.
Carlos Minc, deputado estadual, anunciou que a entidade não irá punir os médicos que prescrevem cannabis medicinal. A conselheira do CREMERJ Margareth Martins Portella garantiu que não haverá perseguição aos médicos e médicas que decidirem seguir prescrevendo a planta ou ministrar aulas sobre cannabis.
“Esta não deverá ser uma preocupação do Conselho hoje. Não faremos força-tarefa para procurar médicos que estão prescrevendo canabidiol ou dando aula. Não será esta a conduta do conselho. Não vamos sair caçando quem estiver infringindo a Resolução do CFM”, afirmou Margareth Martins Portella, médica e conselheira do CREMERJ.
O Conselho Federal de Medicina abrirá Consulta Pública à população para receber contribuições sobre a polêmica Resolução nº 2.324, que restringe prescrição de cannabis medicinal no Brasil.
Resolução do CFM vai na contra-mão de outras resoluções semelhantes
A Resolução nº 2.324 vai na contra-mão de outras resoluções do conselho, como a que permitiu que médicos prescrevessem medicamentos sem eficácia científica comprovada contra a COVID-19 durante a pandemia, como hidroxicloroquina e a ivermectina. Na época (2021) o CFM afirmou “o CFM delibera que é decisão do médico assistente realizar o tratamento que julgar adequado, desde que com a concordância do paciente infectado — elucidando que não existe benefício comprovado no tratamento farmacológico dessa doença e obtendo o consentimento livre e esclarecido. O ponto fundamental que embasa o posicionamento do CFM é o respeito absoluto à autonomia do médico na ponta de tratar, como julgar mais conveniente, seu paciente; assim como a autonomia do paciente de querer ou não ser tratado pela forma proposta pelo médico assistente”.
Fonte: MPF, Porta Cannabis e Saúde e CFM